Filipe Costa Leiria
O pacote do governador Eduardo Leite reproduz no plano regional aquilo que foi permitido na PEC 06/2019 encaminhada pelo banqueiro, hoje ocupante do cargo de Ministro da Economia, Paulo Guedes. A receita não é nova, idealizada pelo setor financeiro, encontra raízes no modelo Chileno. Em síntese, o Estado deve se retirar radicalmente da previdência social, servindo também uma saída paulatina, caso o ambiente político ainda não seja favorável a movimentos mais agudos. Tudo em nome de um superávit financeiro de curto prazo que assegure o pagamento de dívidas com bancos, nunca auditadas pelo poder público. Essa seria a única alternativa, a bala de prata, dos aduladores do projeto chileno, a dupla Guedes e Eduardo Leite.
Engana-se quem pensa que previdência é uma questão de números, trata-se dos rumos civilizatórios que desejamos seguir. Nesse sentido, parece que a vida depois de uma certa idade deve ser punida. O governador Eduardo Leite chegou a brilhante conclusão que o melhor caminho para a sociedade gaúcha é sobretaxar os trabalhadores mais pauperizados para o Estado ter futuro. Estamos falando da ampliação da base de cálculo de aposentados e pensionistas. Pessoas que já cumpriram as regras previdenciárias do seu tempo, estão no período mais vulnerável de suas vidas em termos de capacidade laboral, os orçamentos familiares altamente comprometidos com medicamentos e pagando empréstimos consignados por conta dos parcelamentos de salários. São essas pessoas que irão recolher ao menos 14% sobre tudo que excede um salário mínimo nacional, cobrança atualmente inexistente.
A categoria mais atingida pelo ajuste de Eduardo Leite será a dos professores, curiosamente a mesma categoria que ajudou o governador a se alimentar, vestir-se e desenvolver-se como indivíduo. O governador repete seguidamente que é filho de servidores, em especial, que sua mãe é professora. Hoje, uma professora aposentada recebe em média, líquido, algo em torno de R$2.100,00 e não recolhe previdência. No ideário civilizatório do governador é necessário que seja arrancado dessas pessoas em torno de R$ 154,00 para o Estado ter futuro. Esses recursos jamais serão revertidos em algum benefício previdenciário, como estabelece o princípio da nossa tão combalida Constituição Federal.
Mesmo que se noticie no Chile um número elevado de suicídios entre trabalhadores idosos, atribuídos a pauperização do sistema de previdência, o governador insiste nesse projeto. Tudo mais seria mito segundo ele. De fato, os tempos são de mitologia. Elegemos inclusive um presidente com o apelido de mito. Aqui, o governo também reverencia a mitologia no seu pacote. Talvez mais relacionado ao mito da caverna de Platão. Um projeto onde as simulações contratadas junto ao Banco do Brasil estão em segredo, não aparecem nas rodadas de comunicação que vem fazendo com os servidores. Como as sombras lá fora da caverna, trabalhando com o medo daquilo que não é revelado, o governador deseja que se acredite ser a única solução. Nenhuma revisão das isenções fiscais é possível, tampouco onerar igualmente outros setores da sociedade, fazer uma auditoria da dívida pública também não resolveria segundo o governo. Apenas esses números não revelados, esse que não conhecemos pois estão às sombras, atestam que o melhor a fazer é seguir o destino dos idosos andinos. Destino esse tão desejado por Guedes e reproduzido aqui por Leite.
Recentemente, a diretora-Gerente do FMI, a advogada Christine Lagarde declarou que os idosos vivem demais tornando-se uma ameaça para a economia. Guedes e Leite tem a mesma compreensão civilizatória. Por certo, nesse ideário as pessoas devem morrer a partir de um ponto para a economia se sustente. Se esse ponto não chega ao natural, por que não retirar os recursos dos idosos em nome da economia? Por que não uma necropolítica previdenciária?
Vice-Presidente do CEAPE e Secretário Executivo da UG