Com um orçamento anual superior a R$ 2 bilhões, sem equipe diretiva e sem corpo funcional, o IPE -Saúde é um barco à deriva. Foi assim que o presidente da Federação Sindical dos Servidores Públicos do Estado do Rio Grande do Sul (Fessergs), Sérgio Arnoudt, resumiu a situação da autarquia responsável pelo atendimento à saúde de mais de um milhão de gaúchos, em audiência pública da Comissão de Segurança e Serviços Públicos da Assembleia Legislativa, realizada na tarde desta segunda-feira (13).
Criado em 2018 a partir da divisão do Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (IPERGS) em duas autarquias autônomas, o IPE-Saúde permanece com uma administração provisória, embora, por lei, tenha esgotado em outubro do ano passado o prazo para que o governo do Estado nomeasse os integrantes de seu conselho de administração e de suas diretorias. Além disso, o instituto só funciona porque conta com 42 servidores “emprestados” pelo IPE/Prev, parte do antigo IPERGS que ficou encarregada das aposentadorias do funcionalismo gaúcho. “O quadro é dramático e caracteriza incúria do governo do Estado diante do descompromisso com os servidores e os recursos públicos”, afirma nota distribuída pela direção da Fessergs.
Na manhã desta terça-feira (14), uma comitiva de parlamentares e de representantes de entidades dos servidores públicos, liderada pelo presidente da Comissão, deputado Jeferson Fernandes (PT), deverá se reunir com o chefe da Casa Civil, Otomar Viviam, para tratar do assunto. Um documento deverá ser entregue ao secretário, expondo as preocupações e elencando as reivindicações para contornar os problemas do IPE-Saúde. O encontro foi intermediado pelo líder do governo, Frederico Antunes (PP). “Vamos levar o diagnóstico que fizemos do instituto, que recolhe valores significativos dos servidores, e pleitear uma solução rápida para evitar o agravamento do quadro”, ponderou Jeferson.
O presidente do Conselho Deliberativo do IPE, Luz Fernando Alves da Silva, que responde de forma provisória pela autarquia, defendeu a nomeação imediata das direções do IPE-Saúde e do IPE-Prev. “Os nomes já estão na Casa Civil. Com direção provisória, não tem como estabelecer diretrizes. As soluções virão a partir da definição das instâncias diretivas dos dois institutos”, apontou.
Atrasos nos repasses
O médico Antônio Vargas Alves, diretor do Departamento de Saúde da Fessergs, considera que os problemas do órgão foram agravados com a divisão do IPERGS no ano passado. Responsável por mais de três milhões de consultas anuais, 150 mil baixas hospitalares e 10 milhões de exames laboratoriais, o IPE-Saúde, segundo ele, “se vira” para atender seus usuários com um quadro funcional dez vezes menor do que a segunda maior empresa de saúde privada do Rio Grande do Sul, que conta com 450 trabalhadores para o atendimento de 350 mil clientes.
Já o vice-presidente da Associação Beneficente Antônio Mendes Filho (ABAMF), Jairo Conceição Rosa, denunciou o sucateamento da autarquia e o fechamento dos postos no interior, obrigando os usuários a viajar até Porto Alegre para resolver questões burocráticas. Ele protestou também contra os valores ressarcidos pelas anestesias. Enquanto o custo chega a R$ 3.500,00 em alguns procedimentos, o instituto restituiu o usuário em, no máximo, R$ 500,00.
O atrasos dos repasses da contribuição patronal para o IPE-Saúde é outro problema que a autarquia vem enfrentando. Conforme o auditor do Tribunal de Contas do Estado (TCE) Cristiano Castro Forlin, em cinco ano, o valor em atraso relativo apenas às pensionistas ultrapassou a casa dos R$ 630 milhões. “Em geral, o atraso da parcela patronal é de quatro ou cinco meses. Levando em conta que a folha do funcionalismo é de R$ 1,2 bilhão, cerca de R$ 40 milhões por mês são repassados em atraso”, contabilizou.
Encaminhamentos
A deputada Sofia Cavedon (PT) defendeu a realização de uma reunião com o TCE para tratar de questões que podem configurar irregularidades, como a transferência do patrimônio imobiliário do Fundo de Assistência à Saúde do IPE-Saúde para o Estado e os atrasos nos repasses da contribuição patronal. Propôs também a elaboração de um pedido de informações para os demais Poderes sobre a existência ou não de repasses em atraso.
Já o deputado Sebastião Melo (MDB) quer conhecer o perfil dos usuários do IPE-Saúde e saber se os detentores de grandes salários permanecem no plano. Além disso, questionou os valores pagos aos prestadores de serviços e defendeu mudanças no pagamento a pensionistas. Sobre a não nomeação da diretoria definitiva do órgão, Melo disse que “o governo é lerdo”. “Há seis mil processos parados na Junta Comercial, pois só agora nomeou a direção para o órgão”, revelou.
A audiência foi proposta pelo presidente da Comissão, ABAMF, Fessergs e Associação dos Sargentos, Subtenentes e Tenentes da Brigada Militar e Bombeiros do Rio Grande do Sul (ASSTBM).